sábado, 9 de junho de 2012

Euro 2012: Diário de Bordo 1

uma cobertura que estou a fazer com o Pedro Mateus.

Diário de Bordo: Dia 1

A configuração do grupo A do Euro 2012 foi manifestamente infeliz. O mais grave não é ser o único grupo sem candidato sério à conquista do Europeu, composto por equipas que tradicionalmente não jogam um futebol dominante e de ataque (“atrativo”, vá); afinal, um grupo mais fraco que permita um apuramento inesperado compensado por um “grupo da morte” cria a incerteza necessária a uma fase de grupos. O pior é mesmo tratar-se do grupo A, e por isso mesmo, o primeiro grupo a entrar em jogo, sabendo-se que telespectadores casuais não só estão mais disponíveis para ver grandes competições de desportos que não seguem catolicamente, como também são bastante influenciados pelo primeiro impacto, que muitas vezes parece ter desde logo um tom determinista para o todo da competição (que “vai ser um Europeu muito fechado” ou “está tudo a jogar muito futebol”, e outros ditos que se adequem a cada caso).

Posto isto, o primeiro dia não podia ter corrido melhor: num jogo tivemos a demonstração da imprevisibilidade que o futebol pode ter enquanto jogo; no outro, a apresentação de uma equipa dominante que, continuando a este nível, causará elevada antecipação quando tiver de enfrentar adversários de peso. No primeiro jogo enfrentaram-se duas das equipas menos cotadas do torneio. Se, futebolisticamente, Lewandowski e Szczesny são figuras reputadas na Polónia (e que impacto viriam a ter no jogo!) e na Grécia persiste a aura (resistente desde a vitória no Euro 2004) de, por mais incapazes que possam parecer de criar situações de perigo, serem capazes de vencer qualquer equipa caso as estrelas se alinhem , é nas leituras transdesportivas que encontramos mais motivos de interesse neste jogo.

A Polónia é um dos anfitriões da prova, joga em casa num ambiente infernal, o que geralmente gera algum envolvimento emocional por parte de espectadores casuais, e a Grécia encontra-se numa situação política, económica e social altamente degradada, dando um incentivo extra aos seus jogadores para dar uma pequena prenda ao seu povo. Em campo, um hino ao imprevisível e a primeira grande imagem do Europeu. Duas partes contrastantes e abertas a leituras em vários pontos de vista. Na primeira, a Polónia domina um meio-campo grego, onde a lentidão de processos de Katsouranis e Karagounis fazia com que a única verdadeira solução para chegar a linhas avançadas com um mínimo de qualidade fosse o critério de Maniatis. Lukasz Piszczek mostrava toda a sua categoria enquanto lateral, subindo pelo flanco direito a propósito, capaz de combinar a poucos toques e em tabelas com os companheiros, e cruzando com qualidade havendo espaço (João Pereira, que tal tirar uns apontamentos?), e foi graças a uma das suas subidas que a Polónia chegou naturalmente ao golo, permitindo cruzamento a Błaszczykowski, clássica e belamente concluído, Robert Lewandowski. Os 3 foram campeões pelo Dortmund este ano.

O propósito deste jogo parecia ser dar a conhecer ao mundo um candidato à passagem aos quartos. A Polónia parecia tranquila no jogo, a Grécia completamente desconfortável e, quando o central do Werder Bremen, Sokratis Papastathopoulos, é expulso (de forma exagerada, mas sempre que um jogador coloca os braços sobre o seu adversário está sujeito a que a falta seja marcada), tudo parecia indicar para uma serena caminhada polaca para uma primeira vitória. Pouco depois, o expectro do favorecimento das arbitragens às equipas da casa (olá Coreia 2002) subiu a cena quando Ninis, na sua única acção positiva em praticamente todo o jogo, cruza para um ressalto acidental num braço polaco e não tem direito a penalti. Na segunda parte tudo se transfigura: Fernando Santos retira um desinspirado Ninis da equação, mantém na frente Gekas e Samaras que, controlando e retendo a bola em espaços ofensivos, era um verdadeiro inalador para a sua equipa, e lança em campo o experiente Salpingidis que já tinha treinado no PAOK. Salpingidis muda por completo a face do jogo, mais agressivo, rápido e criterioso, incomoda os polacos adormecidos e justificadamente acaba por fazer o golo do empate apanhando as sobras de um desentendimento do Szczesny com o seu central e depois ganha ainda um penalti e a expulsão do jovem guardião arsenalista.

O conto de fadas grego encontrou um vilão em Przemysław Tytoń, que se estreou em grandes competições ao defender o penalti do veterano Karagounis. A grande imagem do dia é mesmo a reacção de Szczesny, vibrando com a defesa do colega, embora tenha possivelmente perdido o lugar com a sua performance e suspensão de um jogo.


Se no primeiro jogo tivemos emoção, no segundo tivemos performance. A Rússia, fundamentada num esquadrão de St. Petersburgo com sete jogadores do Zenit, complementados com a dupla de centrais do CSKA – Ignashevich e Berezutskiy –, o jovem Dzagoev (também do CSKA) no apoio ao ataque, e o Zhirkov (Anzhi) a defesa esquerdo. Uma das novidades na equipa russa é a titularidade do Malafeev que, embora seja melhor que o Akinfeev, raramente parece merecer tal distinção. No meio campo, Zyryanov e Denisov são demais para os checos. Rosicky e Jiracek têm muita qualidade com a bola no pé, mas falta-lhes agressividade para ganhar divididas, e velocidade para recuperar posição. Na frente, Arshavin joga de cabeça levantada. Tal como Zhirkov, parece ter-se reinventado depois de sair de Inglaterra. Dzagoev e Kerzhakov eram wildcards, estando por provar a sua capacidade de decidir nos momentos de maior pressão. Se o jovem de 21 anos fez figura ao apontar dois bons golos, Kerzhakov adiou a resolução da partida ao falhar outros tantos, e foi só após a sua saída que Plavlyuchenko marcou também presença com um golo extraordinário, depois de técnicas sucessivas de inversão lateral de movimento, culminadas com um forte remate ao angulo da baliza de um Peter Cech que não fez valer os seus créditos. Estará Pavlyuchenko (agora no Lokomotiv de Moscovo) também a apreciar os ares da Rússia? Pode ser que a Premier League não seja para os russos.


O interessante neste grupo é perceber se os russos podem ser uma real ameaça nos quartos de final, ao mesmo tempo que, na última jornada, o Polónia x Rep. Checa tem todo o ar de vir a ser decisivo e um jogo de grande tensão e ambiente (aconteça o que acontecer na segunda jornada, em caso de vitória a Polónia ultrapassará sempre os checos no grupo, o que dificilmente não garantirá um apuramento).


Nota: este artigo foi escrito mais à pressa porque eu e o Pedro só decidimos fazer isto ontem à noite. Em princípio os próximos diários de bordo serão mais cuidados, precisos, e publicados a horas em que ainda sejam relevantes.

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